Em debate recente durante uma aula de filosofia contemporânea, coloquei-me a ponderar sobre o assunto traçando um paralelo entre a atualidade e as outras fases da filosofia na vida pessoas.
O fato é que em sua origem, a filosofia buscava o conhecimento através do questionamento, estabelecendo um vínculo inseparável entre a explicação propriamente dita e a razão naquilo que se observava nos fenômenos sociais, materiais e físicos. Para o filósofo não bastava explicar e justificar qualquer coisa. Precisava haver racionalidade, lógica, nexo, e não apenas crença ou herança do conhecimento já estabelecido como verdade. Esse era a principal divergência entre a filosofia e a religião.
Dali em diante passaram-se muitos anos e o pensamento filosófico foi evoluindo, como qualquer outra ciência, pois o mundo mudou. O homem mudou, a ciência evoluiu e os campos de ciência social também alcançaram resultados inovadores, o que trouxe como principal conseqüência (ou característica) a perda de força das velhas doutrinas e valores comportamentais ditos cristãos na vida das pessoas. Essa foi uma característica verificada desde o final do século XX, onde as expectativas sociais do mundo consumista e igualitário, principalmente com a mulher conquistando o conhecimento acadêmico, o mercado de trabalho e a própria independência financeira, já não se enquadravam mais àquilo que as igrejas apostólicas ensinaram durante todos os anos de existência da religião cristã.
Nesse momento a sociedade construiu intuitivamente uma nova percepção sobre o direito individual, tendo a sua liberdade como um bem inabalável, o que provocou um distanciamento das pessoas das regras comportamentais impostas pelas religiões desde a sua origem.
Esse fenômeno originou uma nova necessidade e consequências pontuais, estabelecendo uma característica que considero a mais marcante no pensamento filosófico atual. De imediato, o desenvolvimento social do indivíduo na busca de sua individualidade trouxe à tona a quebra de tradicionais valores familiares e sociais com a ascensão da valorização do indivíduo e seus próprios conceitos e objetivos pessoais. Daí vem o aspecto que justificou a produção desse artigo: a busca pelo sucesso.
Em sua caminhada rumo ao sucesso (mais do que necessário para a sua própria sobrevivência), o indivíduo, não medindo esforços para alcançá-los, abre mão do relacionamento familiar, do vínculo e estabilidade matrimonial e até de um plano profissional de médio e longo prazo, buscando satisfazer suas expectativas imediatas. Suas necessidades de projeção social prevalecem a qualquer outro propósito, o que os leva a uma vida aparentemente solitária, altamente informatizada e desapegada de qualquer outra coisa que possa atrasá-los em sua busca. E assim o novo homem alcança seus objetivos, mas não se considera ainda “um sucesso”.
Nesse momento é necessário diferenciar “sucesso” de “conquista”. A conquista é mensurável, o sucesso não. A conquista satisfaz um desejo projetado, mas o sucesso nunca se alcança, pois não se sacia após uma conquista. E uma vez reconhecido isso, mesmo sem perceber, o homem moderno passou a sentir falta de uma busca que norteasse a sua vida por toda a sua existência, e daí ressurge a religião em um novo formato: a religião através da espiritualização, e não mais normatizando comportamentos sociais.
A nova sociedade, após “libertar-se” das doutrinas impostas pelas religiões, voltou a buscar um sentido para sua vida através do qual tivesse sempre uma meta a conquistar, dia após dia, através da espiritualização, um caminho de paz, um sentimento de justiça e proteção divina, inclusão e ao mesmo tempo liberdade em uma sociedade religiosa que não lhe impusesse regras mais rígidas do que aquelas que o próprio mundo lhes impõe como cidadãos.
Todo esse contexto explica a visão moderna da filosofia, a qual compactua com uma verdade que combateu em sua origem: a de que o pensamento místico e religioso podem conviver pacificamente com o conhecimento através da razão.
Essa visão certamente foi uma construção baseada no avanço da ciência, a qual dá por consolidado aquilo que a filosofia original trouxe como herança ao mundo moderno, que é a busca da racionalidade em todas as esferas do conhecimento, inclusive no teológico aceitando o ser humano como alguém que necessita da fé no invisível para satisfazer necessidades interiores latentes para o alcance do sucesso pleno, aquele que se conquista após a morte através da ascensão espiritual.
E é nesse momento que cessa a etapa de conquista e o homem é declarado oficialmente um cidadão que alcançou o sucesso, vencendo obstáculos durante toda a sua vida até o dia da sua morte.
Com isso, concluo esse estudo conceituando a filosofia contemporânea como aquela que reconhece o pensamento e a razão como uma busca pelo conhecimento e auto-conhecimento, dando ao homem a liberdade de, mesmo detentor do conhecimento pleno acessível acerca de diversas ciências, poder buscar o conhecimento espiritual, com base na fé, percepção de sentimentos únicos e indefiníveis no qual cada um estabelece a sua porção de certeza e razão.